Volta e meia me vejo em discussões sobre este ou aquele padrão de gosto. Já escrevi várias vezes, inclusive no meu livro “Um designer sozinho não faz milagres” que não se pode impor a beleza para quem não a vê.
Um exemplo? Embora eu admire muito o trabalho do Sergio Rodrigues, acho horrorosa a Poltrona Chifruda. Por outro adoro a cadeira Hill House, mas admito que é uma homenagem ao desconforto. Ambas são classificadas como o tal “bom desenho”.
Bom desenho pra quem?
De acordo com Dieter Rams (1932), designer industrial alemão e um dos mais influentes do século XX, estes seriam os dez princípios do Bom Desenho: O bom desenho é inovador
O bom desenho é funcional
O bom desenho é estético
O bom desenho é inteligível
O bom desenho é discreto
O bom desenho é honesto
O bom desenho é durável
O bom desenho é consequente
O bom desenho é sustentável
O bom desenho é minimalista
O problema, de novo, é que nem o minimalismo, nem a discrição, e nem mesmo a durabilidade são qualidades apreciadas por todos. A sociedade global do século XXI passou a valorizar produtos efêmeros, maximalistas, com forte identidade ou apelo emocional e que nunca serão unanimidade.
Outro dia ouvi um slogan no rádio que achei perfeito. Dizia: “O melhor vinho é aquele que agrada seu paladar”. Achei perfeito! Se determinada combinação de uvas e técnicas não me agrada, então de nada servem as classificações e indicações de especialistas... A indústria da moda também percebeu há tempos que não há como classificar e indicar o que é melhor. Alguém já ouviu falar em “boa moda”?
Mas voltando ao assunto design, minha pergunta é: quem pode assegurar hoje o selo de “bom desenho” para um produto?
Eu sempre defendi a idéia de que é preciso desenvolver a crítica de design no Brasil. O que observamos hoje são editoriais recheados de clássicos modernos e infelizmente os poucos veículos de informação especializados em design tendem a nomear de bom design aquilo que mais agrada seus editores. Eu sei, eu sei, essa é uma fraqueza humana: todos nós tendemos julgar belo aquilo que nos agrada. Mas nem por isso uma editora tem o direito de desconsiderar um produto-sucesso-de-vendas só porque ela não gosta da cor, do estilo, do designer ou da madeira... Sem falar na força dos editoriais pagos, que carimbam um monte de tralhas como “bom desenho”.
E tem mais: os prêmios de design, que em teoria deveriam ser uma chancela do bom desenho brasileiro, muitas vezes premiaram cópias descaradas do design internacional ou dos chamados clássicos. Essas cópias vêm etiquetadas como “releitura” ou “tributo”, dependendo do grau de amizade que o designer tem com quem manda. E no Brasil o produto que ganha um concurso vira “bom desenho” mesmo que não seja.
Todo mundo fala em inovação, em economia criativa e na importância de se desenvolver o design brasileiro, mostrando para o mundo nosso potencial. Mas para isto acontecer seria preciso que a indústria divulgasse o nome dos designers nos seus anúncios para o mercado, prestigiando os bons profissionais. Também seria preciso organizar um prêmio totalmente gerenciado por Designers atuantes e conhecedores da indústria e do mercado, sem vínculo com empresas ou com a imprensa (como o Compasso d‘Oro, da ADI italiana).
Outro pequeno detalhe: no mundo real quem vende design são os arquitetos, e a maioria deles quer mesmo o bom e velho design italiano, maciçamente publicado nas revistas e a um precinho bem camarada (não importando inclusive se são cópias). Para o arquiteto que especifica produtos visando a RT, o bom desenho é mero detalhe.
E finalmente, caro leitor, quero esclarecer que estas minhas observações referem-se ao Design sinônimo de Desenho Industrial. Quando questiono a classificação “bom desenho” estou visando móveis e outros produtos de produção seriada, que movimentam indústrias e alimentam o varejo de decoração no Brasil. As séries autorais e o design-arte não são alvos deste artigo porque gosto não se discute.
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